Lava Jato abriu a caixa-preta do pedágio no Paraná. Quais os próximos passos?


Operação Integração apura pagamento de propina de concessionária de rodovia a agentes públicos. Segundo investigação, corrupção impactou no alto preço das tarifas cobradas

Policiais em ação na quinta-feira (22) durante a Operação Integração
A deflagração da Operação Integração, que mira a concessão de rodovias no Paraná, enterrou de vez as pretensões das empresas em buscar a renovação dos atuais contratos, que vencem em 2021. A nova fase da Lava Jato (48.ª) também joga holofotes no preço do pedágio das rodovias paranaenses – que voltará a ser um tema crucial para a eleição de 2018 –, sem contar que o atual estágio da investigação indica que a campanha eleitoral será permeada por mais revelações de atos ilícitos cometidos por empresas e agentes públicos. Afinal, a caixa-preta do pedágio foi aberta, mas ainda há muito o que desvendar: apenas uma concessionária, a Econorte, foi alvo nesta etapa.
A operação deflagrada na quinta-feira (22) investiga desvios de R$ 63 milhões em obras e contratos firmados com a Econorte, que teriam sido usados no pagamento de propina de agentes públicos, além de permitirem outras fraudes tributárias e contratuais. Entre os mandados cumpridos pela Polícia Federal, foi executada a prisão do diretor do Departamento de Estradas e Rodagem (DER-PR), Nelson Leal Júnior, e buscas no Palácio Iguaçu, na mesa de Carlos Felisberto Nasser, assessor da Casa Civil.
Policiais cumpriram mandados na Celepar

O governador Beto Richa (PSDB) não foi implicado nas irregularidades apontadas, mas o DER é subordinado a Pepe Richa, irmão do governador, que comanda a Secretaria de Infraestrutura. Leal Júnior também foi secretário de Obras de Curitiba na época que Beto Richa foi prefeito e ocupou outros cargos de confiança. Além disso, o tucano será cobrado pela conduta com as concessionárias.

Richa, que deve deixar o governo no fim de abril para se candidatar ao Senado, suspendeu uma centena de ações que questionavam a atuação das concessionárias. Além disso, deu espaço para a discussão da prorrogação dos atuais contratos, algo requisitado pelas atuais prestadoras.

A prorrogação dos contratos no Paraná tem entraves jurídicos, como uma decisão desfavorável da Justiça Federal e condicionantes listados na Lei Federal nº 13.448/17. Mas o lobby das empresas era forte, e os pré-candidatos ao governo estadual estavam sendo cobrados sobre essa possibilidade. Em entrevistas à Gazeta do Povo antes mesmo da deflagração da operação, todos se colocaram contra a possibilidade de prorrogação.

Com a 48.ª fase da Lava Jato, não haverá mais condições políticas para tanto. Desse modo, caberá ao próximo governador, que assume em 2019, preparar o terreno para uma nova licitação. Segundo o presidente da Federação das Indústrias do Estado do Paraná (Fiep), Edson Campagnolo, é fundamental que o estado se prepare para ter o novo modelo de pedágio funcionando no dia seguinte ao fim dos atuais contratos. “No Rio Grande do Sul esperaram vencer para daí fazer a licitação, mas foi criado um vácuo. Precisamos de um planejamento para isso não ocorrer”. Tanto a Fiep como a Ocepar (Sindicato e Organização das Cooperativas do Paraná) destacaram que cobraram o governo em várias ocasiões a respeito do alto custo do pedágio.

A Fiep e a Ocepar defendem uma nova licitação, algo que os pré-candidatos Cesar Silvestri Filho (PPS), Cida Borghetti (PP), Osmar Dias (PDT) e Ratinho Jr. (PSD) concordam. O senador Roberto Requião, porém, diz que faria um pedágio estatal. Ele, notório inimigo das concessionárias, sai ganhando no atual cenário, pelo menos no discurso moral. Em vídeo divulgado nas redes sociais na quinta-feira, ele destacou seu histórico de luta e o antigo bordão: “Pedágio, ou abaixa ou acaba”.

Por outro lado, Cida e Ratinho, mais alinhados a Richa, podem ficar em uma saia-justa com os desdobramentos da investigação. Eles não quiseram se manifestar sobre o assunto. Osmar Dias disse que queria mais informações sobre o tema antes de declarar alguma coisa. Silvestri Filho não foi localizado.

Tarifas
“Simplesmente é uma tentativa de investigar uma ferida aberta no Paraná, que são as tarifas”, disse em coletiva na quinta-feira (22) o procurador Carlos Fernando Lima, do Ministério Público Federal (MPF). “Estamos tentando aprofundar as reais causas dos altos preços do pedágio no Paraná. Esse caso concreto aponta que privatizações não necessariamente levam ao fim da corrupção. Há indícios sérios de pagamento a agentes públicos”, esclareceu.
“A tarifa não se justifica. Segundo as investigações, há camuflagem absurda. Em um dos lotes, se abrisse as cancelas, ainda assim a empresa estaria com lucro maior do que a taxa de retorno prevista contratualmente”, afirmou o procurador do Ministério Público Federal (MPF) Diogo Matos.
As investigações do MPF sobre os contratos de pedágio no Paraná tiveram início em 2013, a partir de auditorias feitas pelo Tribunal de Contas da União (TCU) e do Tribunal de Contas do Estado (TCE), mas entraram na mira da Lava Jato com a descoberta do envolvimento dos operadores Rodrigo Tacla Duran e Adir Assad, envolvidos em lavagem de dinheiro relacionada à Petrobras. 

Segundo o MPF, uma das concessionárias, a Econorte, depositou R$ 1.005.714,50 para Duran entre 2012 e 2014, sem que houvesse contrapartida equivalente. Esta 48.ª fase está focada na Econorte, mas os investigadores dizem acreditar que ilícitos semelhantes foram cometidos pelas outras concessionárias que atuam no estado. 

Com a quebra de sigilo bancário, foi detectado que entre 2005 e 2015, a Econorte recebeu cerca de R$ 2,3 bilhões em tarifas pagas pelos usuários de pedágio. Desse montante, R$ 343 milhões foram repassados para uma subsidiária de conservação de rodovias, a qual repassou R$ 110 milhões para a holding do grupo, Triunfo. Desses, pelo menos R$ 63 milhões foram destinados a empresas de fachada ou para as quais não foi comprovada contraprestação de serviços ou produtos. 

Também foram detectados superfaturamentos de obras. Comparando os custos da concessionária com a tabela Sinapi, da Caixa Econômica Federal, o sobrepreço de alguns itens das planilhas era até 89% superior. Para o MPF, essa “gordura” abastecia pagamentos indevidos, que apontam para um enriquecimento ilícito de agentes públicos. Segundo o MPF, Nelson Leal Júnior comprou um apartamento de luxo em Balneário Camboriú (SC) no valor de R$ 2,5 milhões, dos quais cerca de R$ 500 mil foram pagos em espécie ou com recursos cuja origem não foi identificada nas contas do investigado. 

Leal Júnior é apontado como um dos agentes do DER que subscreveu em 2015 um aditivo ao contrato da Econorte que resultou no aumento de 25% na tarifa paga ao longo dos anos seguintes. E isso apesar de uma determinação do TCU e um estudo técnico recomendarem a redução da tarifa em 18%. Esse aumento não foi a única polêmica: o aditivo não foi discutido em audiência pública nem obedeceu a nenhum parâmetro de transparência. 

Pela investigação, a fraude também permitiu maquiar a contabilidade da concessionária de forma a aumentar despesas operacionais, o que justificava uma dedução maior de tributos, como também servia de argumento para a empresa pleitear novos aumentos de tarifa. “Dessa forma, as tarifas pagas pelo usuário foram elevadas a valores estratosféricos”, diz o MPF. O valor cobrado pela Econorte chega a ser quatro vezes maior do que a tarifa cobrada por outra concessionária do Grupo Triunfo em Goiás. 

Segundo o MPF, os investigados responderão por crimes de associação criminosa, corrupção ativa e passiva, lavagem, peculato e estelionato. 

Outro lado

A defesa de Nelson Leal Junior disse na quinta-feira (22) que estava estudando o caso, mas adiantou que o cliente tem total disponibilidade de prestar todos os esclarecimentos, conforme o advogado Beno Brandão. Em depoimento à PF, Leal Junior e Nasser negaram qualquer irregularidade. 

O governo estadual divulgou nota na quinta-feira, afirmando que o governador Beto Richa determinou a instauração de processo de investigação para esclarecer os fatos revelados pela Operação Integração, a qual será conduzida pela Controladoria Geral do Estado. “Quanto aos fatos que envolvem o sr. Carlos Nasser, esclarece que ele exercia a função de assessor político junto à Casa Civil, cargo de terceiro escalão, sem qualquer vínculo com o gabinete do governador. Em razão disso, o governador determinou o seu imediato afastamento do cargo, até a apuração completa dos fatos”. Tanto Leal Junior quanto Nasser foram exonerados de seus cargos pelo governo ainda na quinta-feira (22).

Fonte da Gazeta

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