Diante da impopularidade do governo e do Congresso, afigura-se lícito argumentar o repasse da incumbência aos novos (espera-se) portadores de capital político
É quase generalizada a ideia de
que a retomada sustentada do crescimento econômico brasileiro requer negociação
política de um apreciável bloco de reformas institucionais capaz de garantir
perenidade à desinflação, em curso há dois anos, devolver funcionalidade ao
aparelho de Estado e multiplicar a eficiência e competitividade da
microeconomia.
De fato, parece imprescindível a
reformulação dos arcabouços tributário, fiscal, financeiro, patrimonial,
administrativo, previdenciário e judiciário do país. Apesar de ter carga de
impostos equivalente à de nações de primeiro mundo, o Estado – totalmente
quebrado por aqui – oferece serviços públicos de qualidade comparável aos
recebidos pelas massas das nações de terceiro mundo, anulando argumentos
ideológicos contrários às privatizações e concessões.
O rombo orçamentário da
Previdência, ainda que não adequadamente explicado pelas instâncias oficiais,
tende a multiplicar com o inexorável fechamento da janela demográfica. Mais
especificamente, enquanto o volume da população total brasileira aumenta 0,7% ao
ano, o segmento de idosos vem avançando mais de 3% ao ano, e a sobrevida das
pessoas com mais de 60 anos, estimada em 15,2 anos em 1980 e 22,1 anos em 2015,
deve chegar a 25,2 anos em 2060, sufocando o regime de aposentadorias.
Até lá, o melhor seria a mínima
interferência das autoridades no cotidiano econômico e social
Na mesma direção desoladora, o
Poder Judiciário consome anualmente 1,8% do PIB no Brasil – contra 0,15% do PIB
nos Estados Unidos, 0,2% do PIB no Chile, e menos de 1% do PIB na Europa – e
exibe contrapartida bastante aquém, em tempo, conteúdo e envergadura, das
demandas e expectativas daqueles que dependem das decisões dos diferentes
colegiados.
No entanto, a convicção quase
plena acerca da necessidade de feitura das reformas não se reproduz na crença
quanto à legitimidade institucional para elaboração e encaminhamento das
discussões dos projetos, em razão dos níveis recordes de reprovação das
atuações do governo e do Congresso Nacional, entes encarregados da liderança,
organização e execução do processo.
A repulsa popular à gestão Temer
é a maior da história republicana, superando até aquela amargada pelo
presidente Sarney nos tempos de hiperinflação, no fim dos anos 1980. Quanto aos
membros da casa de leis, a reprovação da sociedade passa de 60%, acima dos 56%
experimentados em setembro de 1993, ápice da instabilidade gerada pelo
escândalo dos “anões do orçamento”, marcado pela permuta entre propinas e obras
em espaços eleitorais.
Nessas circunstâncias, em clima
de proliferação de levantamento de bandeiras, capitaneado pelo governo e meios
de comunicação, em favor exclusivamente de uma espécie de “meia sola” e,
curiosamente, a qualquer custo, da reforma da Previdência, afigura-se lícito
argumentar o repasse da incumbência aos novos (espera-se) portadores de capital
político, a partir de 2019.
Até lá, o melhor dos mundos seria
a mínima interferência das supostas autoridades no cotidiano econômico e
social, priorizando apenas a consolidação da estabilização macroeconômica,
especialmente a diminuição da inflação e dos juros e a subida dos níveis de
emprego, o que, para surpresa de muitos, produzirá, dentre outros benefícios, a
recuperação da arrecadação e, em consequência, algum fôlego fiscal à combalida
gestão pública.
Gilmar Mendes Lourenço, economista
e consultor, é professor da FAE Business School e ex-presidente do Ipardes.
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