Indulto mais generoso foi decisão política de Temer, diz ministro da Justiça

DANIEL CARVALHO BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - O ministro da Justiça, Torquato Jardim, disse neste sábado (23) que foi uma "posição política" do presidente Michel Temer promover um indulto de Natal mais benevolente para uma série de criminosos, inclusive políticos que estão presos por corrupção.
A decisão de diminuir de um quarto para um quinto o tempo de cumprimento da pena para obtenção do perdão natalino havia sido alvo de recomendação contrária do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, do Ministério Público, da força-tarefa da Lava Jato e da Transparência Internacional. "Tudo isso foi exposto ao presidente da República –que é uma pessoa de direito constitucional, duas vezes secretário de Segurança Pública do Estado de São Paulo, portanto tem profundo conhecimento da matéria– [que] entendeu que era o momento adequado para se mudar a visão, ter uma visão mais liberal da questão do indulto", disse o ministro da Justiça na entrevista que convocou para tentar diminuir a polêmica gerada pelo indulto. Ao comentar novamente o assunto, ele disse que o Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária é um "órgão de consultoria, não de decisão" e reiterou que a decisão do presidente foi política.

'MAIS LIBERAL'
"O presidente Michel Temer é um professor de direito constitucional e entendeu como posição política, que reflete uma visão mais liberal do direito penal sem dúvida, que manter o apenado em regime fechado não é necessariamente a melhor solução." Mas o indulto de Temer não beneficia apenas quem está atrás das grades, mas também quem está cumprindo penas restritivas, não apenas dentro da prisão.
O indulto ou a comutação de pena alcançam a pena de multa aplicada cumulativamente, ainda que haja inadimplência ou inscrição de débitos na Dívida Ativa da União, observados os valores estabelecidos em ato do Ministro de Estado da Fazenda. Para o ministro, isso é um "avanço de liberalidade" e "uma visão menos restrita do direito".
Torquato negou que o governo saiba quem serão os beneficiários da medida de Temer. Ele também disse que é preciso "apelar para o bom senso" para entender o benefício natalino concedido pelo governo, mas reconheceu que é difícil entender a medida. Acrescentou que "é uma aposta que a sociedade tem que fazer" e que não é possível ter "preconceito". "Não é fácil explicar à opinião pública, no momento político onde tantos, dezenas de personalidades ou já foram condenadas ou estão sendo investigadas. Compreendo muito bem que o senso de justiça do cidadão comum fica um pouco abalado. Talvez seja teoria demais para explicar", afirmou Torquato Jardim.
O ministro disse que o decreto atende aos princípios como impessoalidade e universalidade e que, entre outros fatores, levou em consideração questões como a superlotação das cadeias brasileiras. "A norma é impessoal, é abstrata, atende à universalidade porque fora dos regimes democráticos, a legitimidade é tão importante quanto a legalidade", afirmou. Ele também disse que, por isso, não poderia excluir os crimes financeiros da lista dos seis que são contemplados no indulto –combate a drogas, tráfico de armas, tráfico humano, crimes cibernéticos e o terrorismo. "Como hierarquizar esses seis para dar preferência a um e permitir o outro?", indagou Jardim.
"A personalização do indulto e buscar resultado concreto antecipado é incompatível ao Estado Democrático. Temos que operar dentro do sistema da Constituição de 1988. Escolher a quem perdoar ou punir é retorno ao arbítrio", ponderou o ministro. Procurado, o Palácio do Planalto limitou-se a dizer que "o presidente da República concedeu o indulto de acordo com o Artigo 84, inciso XII, da Constituição Federal".

O INDULTO
O governo publicou na sexta-feira (22) o decreto anual de indulto de Natal, reduzindo nos casos sem grave violência ou ameaça o tempo de cumprimento da pena para a obtenção do perdão. Na lista de crimes que se enquadram neste perdão natalino concedido pelo presidente Michel Temer estão aqueles contra a administração pública, como corrupção. Com a benesse concedida, o preso precisa cumprir um tempo de pena menor –"um quinto da pena, se não reincidentes, e um terço da pena, se reincidentes, nos crimes praticados sem grave ameaça ou violência à pessoa".
No ano passado, o decreto presidencial com o perdão natalino estabelecia que teria que ser cumprido no mínimo um quarto da pena. O procurador Deltan Dallagnol, coordenador da força-tarefa do Ministério Público na Operação Lava Jato, criticou o indulto, que chamou de "feirão de Natal para corruptos", e o próprio presidente Michel Temer. "Temer prepara uma saída para si (se condenado) e para outros réus da #LavaJato: agora, corruptos no Brasil cumprirão apenas 1/5 da pena e serão completamente indultados (perdoados), como regra geral", escreveu o procurador no Twitter.
Dallagnol lembra que o decreto ignora manifestação do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, do Ministério Público, da força-tarefa da Lava Jato e da Transparência Internacional. "É um feirão de Natal para corruptos: pratique corrupção e arque com só 20% das consequências –isso quando pagar pelo crime, porque a regra é a impunidade", disse o coordenador da força-tarefa em sua conta na rede social.
O procurador cita como exemplo de beneficiado o ex-deputado federal João Argolo (ex-SD-BA), que foi condenado pelo juiz federal de Curitiba (PR) Sergio Moro a 11 anos e 11 meses de reclusão. Na decisão, Moro anotou que o condenado recebeu pelo menos R$ 1,4 milhão do esquema de corrupção instalado em vários setores da Petrobras. "João Argolo, político preso em abril de 2015, agradece a Temer o indulto de Natal. Condenado na Lava Jato a 12 anos e 8 meses por corrupção e lavagem, já pode sair da cadeia", apontou Dallagnol.

Sem citar nomes, o procurador estendeu suas críticas ao ministro Gilmar Mendes, do STF (Supremo Tribunal Federal), que também libertou presos neste final de ano. "Meus parabéns pela ótima mensagem que o Planalto passa à população sobre sua atitude diante da corrupção. Não poderia ser mais claro. Aliás, não é só ele. Tem gente em outros Poderes que neste final de ano está passando a mesma mensagem."

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