Dificuldades logísticas, alto volume de pedidos e confusão nos processos explicam o problema. Correios está investindo para diminuir a demora na entrega dos pedidos feitos em lojas chinesas
Com preços mais baixos e frete gratuito, os sites de compra chineses
atraem cada vez mais brasileiros. De acordo com o estudo Webshoppers 2017,
realizado pela Ebit, o gigante chinês AliExpress foi o preferido dos
brasileiros que compraram em sites de fora em 2016, à frente de grandes
corporações como as norte-americanas Amazon e Ebay. Dos entrevistados no
estudo, 45% afirmaram terem feitos compras pelo site chinês no ano passado,
contra 40% na Amazon e 26% no Ebay. Entre os itens preferidos dos brasileiros
estão artigos eletrônicos e de informática, moda e acessórios, celulares,
brinquedos e games.
Se a economia de dinheiro é um atrativo, uma questão acaba incomodando
os consumidores que decidem aproveitar essas ofertas: a demora para receber a
encomenda. Como é que suas compras, feitas em sites chineses como AliExpress,
GearBest, Tmall e DealExtreme, chegam ao Brasil? E por que às vezes demora
tanto para que ela chegue à sua casa?
Processo de importação
Em primeiro lugar, ao comprar fora do Brasil o consumidor realiza uma
importação, e, por isso, está sujeito a todas as regras impostas pelo governo
brasileiro, independente do volume da compra. “A interface dos sites pode
enganar. O site é da China mas está inteiro em português, você paga por boleto
e na moeda local. Mas é um processo de importação sujeito a regras”, explica
Lemuel Costa e Silva, chefe do Departamento de Encomendas e E-Commerce dos
Correios.
Como chegam ao Brasil?
A fama de Curitiba
Novo modelo de importação
Dicas para não se frustrar
A grande diferença está mesmo no
método de entrega. No Brasil, os Correios oferecem serviços de entrega expressa
ou econômica, como Sedex e PAC, em que é possível rastrear o objeto de ponta a
ponta. Em compras internacionais, isso nem sempre acontece. A maioria dos sites
tem frete grátis, mas o tipo oferecido é o mais barato, chamado Pequena
Encomenda Simples, que não tem código de rastreamento, o que impossibilita
acompanhar o trajeto da encomenda. Outra opção comumente disponível é a Pequena
Encomenda Registrada, que oferece o código de rastreamento, mas apenas na
chegada ao Brasil e na entrega ao destinatário.
Ambos possuem prazos de entrega
mais dilatados, com toda a logística ao chegar ao Brasil feita por via
terrestre. O prazo de entrega que os Correios estimam para esses serviços é de
40 dias úteis após a liberação pela fiscalização alfandegária. Em média, desde
a postagem, a espera pela encomenda pode chegar a 60 dias úteis.
De acordo com Costa e Silva, 95%
de tudo que vem para o Brasil vem como Pequena Encomenda; na maioria dos casos,
como Pequena Encomenda Simples. “No Brasil, não temos modalidade parecida com
esta, o que acaba gerando insatisfação dos consumidores acostumados a terem
informações mais detalhadas sobre a entrega de suas compras”, afirma.
Diariamente, chegam cerca de 200 mil encomendas vindas da China para análise
nos centros de tratamento internacionais.
Como chegam ao Brasil?
A maioria das compras chega ao
Brasil por via aérea. É a forma mais rápida, o que não quer dizer que a mercadoria
é postada em um dia na China e no outro já aterrizou aqui. “Em uma analogia às
viagens de ônibus, é como se fosse um avião ‘pinga-pinga’, que vai parando em
diversos locais durante o trajeto. Não existe regra definida, nem garantia de
que o consumidor que comprou hoje terá sua compra já empacotada e enviada
amanhã. Isso pode levar dias”, conta Costa e Silva.
“Os aviões têm trajetos e datas
pré-estabelecidos, não é como se tivesse um avião esperando pela sua compra.
Ele faz escalas. Só isso pode levar de 15 a 20 dias até chegar aqui”,
complementa a consultora de varejo Giuliana Grinover, da AGR Consultores.
As compras também podem ser
enviadas em contêineres de navios, mas é menos utilizado pois exige uma série
de documentos das empresas de transporte para uma importação formal, o que o
torna menos interessante. Os Correios também oferecem o Express Mail Service
(EMS), que seria a forma expressa de entrega, parecida com o Sedex, com a
possibilidade de rastreamento e prioridade de entrega para documentos e mercadorias
de até 30 kg . O serviço, no entanto, custa mais caro e nem sempre está
disponível nos sites dos vendedores.
Outra forma são os couriers,
empresas que podem ser contratadas e que entregam mais rápido, mas que chegam a
custar 30 vezes mais. “Esse tipo de entrega é recomendado para quem tem pressa
em receber o produto. Mas para a maioria dos consumidores não é interessante
pelo alto custo, uma vez que os bens adquiridos de sites chineses costumam ter
pouco valor agregado”, explica Grinover. Ela lembra ainda que muitos dos
fornecedores desses sites estão localizados no interior da China, então além do
transporte até o Brasil, há ainda os problemas de logística internos chineses.
A fama de Curitiba
Chegando ao Brasil, se utilizados
os serviços postais oficiais, os pacotes são distribuídos em três Centros de
Tratamento Internacionais do Correios, que organiza e disponibiliza toda a
carga para inspeção da Receita Federal. Os centros estão localizados em São
Paulo, Rio de Janeiro e Curitiba. Além dos Correios e da Receita, também atuam
nestes locais outros órgãos de controle, como a Anvisa, o Exército, a Vigiagro
e a Polícia Federal.
Cada um destes centros é
especializado em uma modalidade de serviço postal. Para São Paulo, são
destinadas as encomendas EMS, que, após nacionalização, ou seja, quando o
produto já está liberado para entrega pelos Correios, são enviadas via Sedex. O
Rio de Janeiro recebe as chamadas Colis Postaux, já uma modalidade econômica,
mas geralmente destinada a cargas mais pesadas, de 5 a 10 kg.
É em Curitiba que o grande volume
de compras chega, com as Pequenas Encomendas Registradas e Simples. São pacotes
pequenos, com 200 g a 300 g, mas em quantidades enormes. Diariamente, são cerca
de 200 mil pacotes. Isso explica, em parte, porque a capital paranaense tem
recebido a fama de ser onde as compras internacionais ficam paradas.
“Uma parcela da população acaba
culpando os Correios, porque quando vai rastrear a mercadoria vê que está em
Curitiba. Mas na verdade o que acontece é que como o tipo de frete contratado
não oferece rastreamento de ponta a ponta, só temos como informar quando chega
ao Brasil, no caso em Curitiba, e quando chega ao destino final”, explica Costa
e Silva.
A chefe da Inspetoria da Receita
Federal em Curitiba, Cláudia Regina Leão do Nascimento Thomaz, exemplifica: uma
remessa destinada ao Acre, por exemplo, será recebida no Brasil por Curitiba,
momento no qual terá registro no sistema de rastreamento, mas precisará viajar
por todo o país para só então ter o próximo movimento registrado no sistema, no
momento da entrega. “As remessas recebidas em Curitiba são tratadas pela
Receita normalmente no mesmo dia ou no dia seguinte. Quando uma consulta ao
site dos correios indica que a remessa ainda está na fase de tratamento em Curitiba,
o mais provável é que já tenha saído há muito tempo de lá e esteja dentro do
fluxo postal normal de entregas do Correios”, esclarece.
Novo modelo de importação
A Receita Federal divide os
documentos e encomendas em Remessa Expressa, que são as feitas por transporte
expresso internacional — os couriers — e Remessa Postal Internacional, feitas
por meio do serviço postal oficial de cada país. A base legal da tributação é a
mesma, com utilização do regime de tributação simplificado e aplicação de alíquota
única de imposto de importação de 60% do valor do produto.
A maneira de tributação era
diferente até pouco tempo. Em setembro de 2017, foi publicada a Instrução
Normativa RFB nº 1737 e a tributação tanto de remessas expressas como postais
ocorre por meio de apresentação da Declaração de Importação de Remessa (DIR)
pela empresa responsável pelo transporte. Até então o Regime de Tributação
Simplificado com uso de Nota de Tributação Simplificada se limitava a remessas
sem fim comercial e de até U$ 500,00. Fora de tais critérios era necessário o
uso de Declaração de Importação ou Declaração Simplificada de Importação, que
são mais complexas e podem demandar serviços de despachante.
Agora as remessas de até US$ 3
mil podem ser nacionalizadas por meio da Declaração de Importação de Remessa,
registrada pelos próprios Correios ou empresa de courier, não havendo mais
proibição para uso da modalidade nas importações realizadas por pessoas
jurídicas para fins comerciais. “O pagamento do imposto é feito pela empresa diretamente
à Receita Federal Brasileira. No caso das remessas expressas, algumas empresas
optam por cobrar do cliente para só então recolher os tributos e liberar a
remessa, outras optam por adiantar o pagamento à Receita, liberar a remessa
imediatamente e cobrar do cliente no momento da entrega”, esclarece
inspetora-chefe.
De acordo com Costa e Silva, o
novo modelo de importação modernizou o processo, com implementação do Siscomex
Remessa, que permite que os Correios repassem informações para a Receita eletronicamente.
“Antes a inspeção era feita fisicamente, item por item. Agora este tipo de
inspeção é pontual, caso haja alguma irregularidade”, explica. Além disso,
ficou mais fácil pagar o imposto, caso a compra seja tributada.
No antigo modelo, que está sendo
extinto, as encomendas tributadas eram encaminhadas para uma agência. O
destinatário recebia em casa uma carta notificando a chegada dela e a retirada
era feita mediante o pagamento dos tributos, em dinheiro em espécie, apenas,
diretamente na agência dos Correios, que posteriormente repassava o valor à
Receita.
No novo modelo, a encomenda
taxada fica no próprio Centro de Tratamento e o pagamento do tributo pode ser
feito pela internet, por meio de boleto bancário ou cartão de crédito,
disponível no site dos Correios. O novo modelo funciona, até então, apenas em São
Paulo, Curitiba e Rio de Janeiro, neste último implementado no dia 11 de
dezembro, mas deve ser aplicado a todo país em 2018.
Investimentos e cooperação com
chineses
Os Correios estão investindo
R$280 milhões para aumentar seus pátios de tratamentos e automatizar o serviço.
De acordo com Costa e Silva, o plano é triplicar a capacidade de tratamento
automatizado para 2018. No entanto, novamente, são encontradas algumas
barreiras, como a falta de padronização das etiquetas. “A maioria vem sem o CEP
destinatário, por exemplo, e nossas máquinas não conseguem ler, aí precisamos
fazer a separação manualmente. Temos participado de fóruns internacionais
discutindo este assunto até de forma bilateral com a China, para que essas
encomendas comecem a chegar em um padrão que possa ser lido pelas máquinas,
otimizando o tempo”, explica.
Além disso, outro plano dos
Correios, que deve ser implementado nos próximos três meses é oferecer aos
consumidores a opção de mudar a modalidade de entrega a partir do momento em
que a encomenda for nacionalizada. Ou seja, após liberado pela Aduana, mesmo
que tenha sido uma Pequena Encomenda Simples em sua origem (aquela sem
possibilidade de rastreamento), seria possível contratar mediante pagamento
extra pela entrega via Sedex ou PAC, por exemplo.
“Os Correios está atuando em duas
frentes para diminuir a insatisfação dos brasileiros que fazem este tipo de
compra: em primeiro lugar, criar a alternativa do upgrade de tipo de entrega,
mesmo que simples, mas que ofereça um mínimo de informação ao usuário, e em
segundo lugar, nos aproximar destes grandes sites internacionais para
conseguirmos negociar melhores condições. Para 2018, estas são nossas
prioridades”, informa Costa e Silva.
Dicas para não se frustrar
Para a consultora Giuliana Grinover,
muitos brasileiros já fazem compras internacionais sabendo que a entrega pode
demorar, mas como os preços são atrativos, não se importam tanto. “O problema
logístico muitas vezes fica em segundo plano diante da variedade de produtos e
das políticas agressivas de preço baixo. A primeira dica, então, é comprar sem
pressa para receber”, orienta. “Se tiver pressa, pode optar pelos serviços
expressos mais caros, mas como a maioria dessas compras é de itens com pouco
valor agregado, quase que supérfluos, poucos consumidores optam por pagar o
preço alto para receberem rapidamente sua compra”, explica.
Além disso, ela alerta sobre a
qualidade de alguns produtos, principalmente de vestuário. “Uma das principais
reclamações em sites como o Reclame Aqui é quanto a diferença do produto
recebido para o que estava na foto, principalmente de roupas e acessórios.
Também é preciso, nesses casos, ficar atento à numeração das roupas, que é
bastante diferente da do Brasil. Por isso, é preciso calma na hora de comprar,
na empolgação pelo preço baixo, para não se frustrar com o produto que vai
receber”, orienta.
O Correios também dá outras
orientações importantes. É importante pesquisar sobre os fornecedores
conhecidos e de confiança e se possível conversar com outros compradores do
mesmo vendedor, verificar se a página utilizada fornece claramente seu endereço
eletrônico e outras informações necessárias para sua localização, além de
serviços de atendimento ao consumidor para eventuais reclamações, e informar-se
sempre sobre as condições de troca e devolução do fornecedor, fundamental caso
haja algum problema com a mercadoria adquirida.
Por último, Costa e Silva lembra
que até que seja entregue, a mercadoria é responsabilidade do vendedor.
“Antigamente, quando o Correios tratava apenas de cartas, os destinatários nem
sabiam que iam receber algo, então o dono da correspondência é sempre quem a
enviou e isso só muda após a entrega ao destino final. Esta é ainda a forma
como serviços de correios funcionam no mundo. O dono da encomenda, portanto, é
o vendedor”, esclarece.
Mesmo que, ao pagar o frete, o
comprador já se sinta dono da mercadoria, na prática não é assim. “Muitos
pensam que, se não recebem a mercadoria que já pagaram o frete, devem entrar em
contato conosco. Mas o frete foi pago para o vendedor, então no caso de
extravio, por exemplo, o contato deve ser feito diretamente com quem vendeu”,
finaliza.
da Gazeta
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